sexta-feira, 12 de novembro de 2010

O grito autobiográfico de Wendy Guerra

Segue a resenha sobre o livro Nunca Fui Primeira-Dama, da cubana Wendy Guerra. Escrevi esse texto para o curso de Jornalismo Cultural, ministrado no Espaço CultCasper pelo jornalista Daniel Piza, de O Estado de S.Paulo.


Difícil discernir o que é ficção e realidade no livro Nunca Fui Primeira-Dama (Benvirá, 256 páginas), segundo romance da também poeta cubana Wendy Guerra. Ao utilizar diversos recursos de narrativa (diários – que já usou em seu primeiro romance, Todos se Van –, transcrição de programas de rádio, radionovela, cartas e anotações), a autora traz o público para bem perto de si e do povo cubano pré e pós-revolução de 1959, ao escrever grande parte do livro em primeira pessoa e em tom confessional, sob o alter ego Nadia Guerra.

A história gira em torno de Nadia, uma artista plástica e radialista que vive com o pai, já que a mãe, Albis Torres, foi embora. fugindo da revolução de Fidel Castro, quando ela tinha apenas 10 anos – algo que realmente aconteceu. Nadia começa a se questionar a respeito de como seria sua mãe, também radialista, e decide procurá-la.
A facilidade com que Nadia encontra a mãe, em Moscou, traz ao leitor a sensação de incredulidade, já que, para tanto, ela se corresponde por cartas com antigos amigos de Albis que mal sabiam o paradeiro dela. Após o encontro de Nadia com a mãe, que não mais anda e é vítima do Mal de Alzheimer, o romance dá uma reviravolta: Nadia quer saber quem realmente foi sua mãe.

Para isso, tenta trilhar o mesmo caminho de Albis. Inclusive, relaciona-se sexualmente com um ex-amante de sua mãe, Paolo, em um momento que Nadia considerava epifânico devido ao objetivo que ela tem (de descobrir quem era Albis), mas que não é alcançado. Mais tarde, Nadia descobre que este homem é o seu verdadeiro pai.

Quando consegue trazer a mãe de volta a Cuba, Nadia fica em segundo plano no romance. É a história de Cuba (principalmente antes e pouco após a revolução de 1959) que vem à tona, a partir de anotações e gravações que a mãe dela trouxe e do original de um livro que escreveu sobre Celia Sánchez, a mulher que esteve ao lado de Fidel Castro durante a revolução e que hoje muitos apontam como sendo amante dele, embora o livro de Wendy não diga isso de forma direta. Na vida real, Albis Torres fugiu de Cuba após terem destruído o projeto do livro sobre Celia.

Somente na terceira parte da obra o nome Fidel é citado. Em entrevistas, Wendy Guerra diz que não tinha interesse em fazer críticas ao governo. Difícil de acreditar. Afinal, desde o início da obra, isso é feito de forma indireta. Nadia não fala de ações governamentais que possam ter prejudicado a população, mas descreve como o povo vive e o mostra como vítima, embora não diga de forma direta quem é o seu algoz. Sutilezas no texto tornam-se críticas ácidas aos olhos do leitor mais atento. A respeito de uma instalação sua, Nadia escreve: “Os jornalistas comentam a Biblioteca Branca que construí, um lugar imaculado no qual livros, papéis, documentos, lombadas e capas estão em branco. O mobiliário pronto para ser lido, pronto para informar; em compensação, não há nada dentro dele”. Encontra-se muito de Wendy nessa frase, já nenhum de seus cinco livros (três de poesias e dois romances) foi publicado em Cuba.

Em seu diário, Nadia faz reflexões acerca da vida da população, o que leva o leitor a também pensar a respeito do assunto. “Juntos, cultivamos a arte da ‘perda necessária’. Mas as perdas são necessárias?” Nadia não se propõe a dar respostas, apenas lança questões como se estivesse desesperada para que alguém lhe respondesse.

Dessa forma, Wendy cumpre, em parte, o que já disse em entrevistas, de que o livro foi escrito “para os cubanos e pelos cubanos”. “Desde menina, repito seus nomes como um robô”, diz Nadia acerca dos heróis da revolução.
Não esquecendo o lado poeta, do qual Wendy já confessou gostar mais, a autora lança mão de figuras de linguagem, especialmente metáforas, comparações, sinestesias e prosopopeias. Por vezes, o texto em formato de prosa soa como poesia. “Minha dor é salgada” e “som que golpeia a testa” são alguns exmeplos.

Nunca Fui Primeira-Dama também pode servir de ponto de partida para quem deseja conhecer melhor a cultura cubana. Diversos locais, como o Museu de Belas-Artes, e artistas, como Célia Cruz, são citados. Espalhados ao longo de toda a obra, trechos de músicas de artistas cubanos servem como complemento ao assunto narrado.

Em uma passagem do livro, Nadia se revolta contra a censura sofrida pela mãe, impossibilitada de publicar o livro sobre Celia Sánchez. “Pergunto-me quando vão deixá-los sobvreviver nas alfândegas, ou em que momento vão ser editados em Cuba de uma vez por todas. Nem mais um livro escondido, nem mais uma palavra silenciada. Esse é o meu maior desejo como cidadã”. Praticamente um grito autobiográfico de Wendy Guerra.

domingo, 29 de agosto de 2010

Surpresas que a Flip 2010 me trouxe - Ferreira Gullar

Prestes a completar 80 anos, em 10 de setembro, o poeta Ferreira Gullar me surpreendeu bastante na Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), onde bateu um papo muito descontraído com Samuel Titan Jr. - para deleite das centenas de pessoas que o acompanhavam na tenda dos autores e no telão (o meu caso). Não sei o motivo, mas ao ver as fotos daquele senhor sisudo, que pouco sorri nas imagens, tinha uma imagem totalmente diferente (e deturpada) deste grande poeta brasileiro, um dos maiores ainda vivos, ao lado de Adélia Prado. Achava-o mal humorado.

A mesa Gullar 80 foi uma das mais bacanas da Flip, pois o entrevistado falou sobre toda a sua carreira de uma forma bem humorada, arrancando risos dos espectadores.

Em um dado momento, ele disse para Titan Jr: "O pessoal fica rindo de tudo o que eu falo, pô!". Talvez esse seja o segredo da longevidade com lucidez. Fazer piada e poema de tudo, até de si próprio.

Em seu novo livro Em Alguma Parte Alguma (Ed. José Olympio), um dos poemas que mais se destacam fala de uma descoberta recente do autor: a de que possuía osso. Ao atender o telefone bruscamente, seu fêmur bateu na bacia. Disso, saiu o poema Acidente na Sala, que declamou durante o bate -papo.

Outra característica que me chamou bastante a atenção é a simplicidade de Ferreira Gullar ao comentar seus erros e acertos na carreira, bem como a modificação que sua poesia sofreu ao longo dos anos. Com a maior naturalidade, mostrou para o público que saiu do movimento concretista por não mais se identificar com aquele tipo de poesia.

Ferreira Gullar mereceu, sem dúvida. todos os aplausos que lhes foram atribuídos após a mesa na Flip. Aplausos de pé, que duraram cerca de 1 minuto e meio.


Veja mais Ferreira Gullar


http://www.youtube.com/watch?v=CC_AHTfqCG8 - Vídeo oficial Flip (vale a pena!!!!!!!!!!)

http://www.youtube.com/watch?v=HdDa81Vd6ak - Saiba mais sobre o poema Acidente na Sala e veja Ferreira Gullar declamando-o



Tá entendendo?*


*Expressão muito utilizada por Ferreira Gullar a cada fim de frase ou explanação.

sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Surpresas que a Flip 2010 me trouxe - Marcelo Jeneci


Depois de quase dois meses sem atualizar o blog, senti muita necessidade de dividir com vocês alguns bons momentos que passei durante a Festa Literária Internacional de Paraty (Flip).

Não fiz qualquer anotação durante os quatro dias de evento, pois o meu interesse não era reproduzir o que facilmente seria encontrado em outros sites. Dessa forma, deixei o meu coração guiar os temas deste e dos próximos posts.


Começo com um artista que chamou muito a minha atenção durante o show de abertura, cuja atração principal era o cantor Edu Lobo. Para mim, quem brilhou mesmo no palco foi o multiinstrumentista Marcelo Jeneci, que eu não conhecia.


Ele talvez tenha me cativado, a princípio, por tocar acordeon. Fico fascinada quando vejo alguém tirando notas desse instrumento, que considero um dos mais difíceis. Fazendo uma rápida pesquisa na Internet (confesso que não me aprofundei), soube que Marcelo ganhou a primeira sanfona de Dominguinhos. Nada mau, né?


Desde as primeiras músicas, ele me chamou a atenção e olha que ele só tocava o acordeon e fazia segunda voz, junto com outros músicos, para a cantora Renata Rosa. Ah! O show tinha direção do Arthur Nestrovski (diretor artístico da Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo).


Mas Marcelo foi além. Cantou algumas canções, acompanhado do acordeon, mas me emocionou bastante ao executar sua última música, ao piano. A música se chama Feito pra Acabar, uma composição própria (com José Miguel Wisnik e Paulo Neves), e, não sei se a melodia ou a letra, possivelmente as duas juntas, me emocionaram logo nos primeiros acordes.


Fiquei com essa canção na cabeça e fiz uma busca no Youtube. Acho que ela transmite a mim a sensação de finitude do ser humano além de questionamentos que não sabemos responder.


Descobri que Marcelo é parceiro do Arnaldo Antunes e que Vanessa da Mata e Zélia Duncan já gravaram suas canções. Sim, meu coração e meus ouvidos não me trairam. Trata-se de um baita músico. E que também toca guitarra.


Abaixo, os links da música no Youtube e a letra






Quem me diz

Da estrada que não cabe onde termina

Da luz que cega quando te ilumina

Da pergunta que emudece o coração

Quantas são

As dores e alegrias de uma vida

Jogadas na explosão de tantas vidas

Vezes tudo que não cabe no querer

Vai saber

Se olhando bem no rosto do impossível

O véu, o vento e o alvo invisível

Se desvenda o que nos une ainda assim

A gente é feito pra acabar

Ah Aah
A gente é feito pra dizer

Que sim

A gente pra caber

No mar

E isso nunca vai ter fim
Uh Uhhh



quarta-feira, 16 de junho de 2010

Peça Dona Flor e Seus Dois Maridos*


Dona Flor e Seus Dois Maridos, um clássico da literatura brasileira oriundo da mente genial de Jorge Amado, tem uma história bastante conhecida. Já foi levada à telona em 1976, pelo diretor Bruno barreto, e à televisão em formato de minissérie, em 1997, por uma adaptação de Dias Gomes, Ferreira Gullar e Marcílio Moraes.

A versão teatral, em adaptação feita pelo diretor Pedro Vasconcelos e pelo ator Marcelo Faria, a intenção é encantar o público com os recursos que o teatro permite e, é claro, trazer a aBahia para bem perto, por meio do Carnaval, da cenografia, dos pratos preparados por Dona Flor e pela trilha sonora.

"No espetáculo, a história é contada desde o início, quando Vadinho e Flor se apaixonam (só no teatro a história começa no início do livro). O público se sente como se estivesse na Bahia. A peça se desenvolve no palco e nos corredores, remetendo às vielas do Pelourinho", conta Faria, intérprete de Vadinho.

A direção musical, assinada por Bruno Marques, é toda baseada na obra de Dorival Caymmi. Na peça, Diogo Brandão interpreta Caymmi e canta, entre outras, Morena do Mar, O Que é Que a Baiana Tem, Acontece Que Eu Sou Baiano e A Vizinha. Parte do elenco o acompanha, em coro.

O espetáculo é um desafio e tanto para os atores. Fernanda paes Leme debuta no teatro.

"Fernanda topou na hora fazer a Dona Flor e era esta a personagem que estávamos procurando: uma mulher forte, mas também doce e delicada. Ela está incrível", comemora Faria.

A Duda Ribeiro, que interpreta Theodoro, o segundo marido de Flor, foi dado o desafio de fazer um personagem sério, extremamente educado. Logo para ele, que veio da comédia.

"Ele encontrou o tom perfeito do personagem", elogia Faria, que precisou se adaptar à malandragem, à dança e ao gingado de Vadinho. Sim, o ator teve de aprender a dançar.


Para quem espera ver Marcelo Faria nu o tempo todo, vale o aviso: em acordo com Vasconcelos, ficou decidido que isso não ocorreria. "Não há necessidade", diz ele, que aparece nu na volta de Vadinho ao mundo dos vivos e no final da peça.

Até 27 de junho, o espetáculo segue em cartaz no Teatro Municipal de Niterói (Rua XV de Novembro, 35, Centro, Niterói, Rio de Janeiro). Sextas e sábados, às 21 horas, e domingos, às 20 horas.
*Adaptado do original publicado no jornal A Tribuna em 31 de julho de 2009.

quarta-feira, 9 de junho de 2010

100 anos de Pagu. Viva!


Patrícia Galvão. Ou simplesmente Pagu. Um apelido pequeno, dado pelo poeta Raul Bopp, para referir-se a alguém cuja vida não teve nada de diminuta.

Há 100 anos, ela nascia. Por quais motivos tanto é ovacionada? Pagu é uma daquelas mulheres que estava à frente de seu tempo. Seu comportamento poderia ser considerado atrevido por uns, vanguardista por outros.

O certo mesmo é que ela deu a sua contribuição para a sociedade. Seja na cultura, como membro do movimento antropofágico, ou na política, como integrante do Partido Comunista ou, mais tarde, defendendo o socialismo de Trotski.


Como qualquer heroína, Pagu foi presa 23vezes, a primeira ao participar da organização de uma greve dos estivadores em Santos.

Ousada também no amor, Pagu 'roubou' Oswald de Andrade de Tarsila do Amaral, pessoa que a praticamente a acolheu. Ok, não foi uma atitude muito nobre, especialmente para os idos de 1930. Concordo. Com ele, teve um filho, Rudá. O romance durou apenas 5 anos.


Separou-se de Oswald. Para a época, um escândalo, embora Pagu estivesse acostumada a provocar reações nas pessoas. Boas ou más.



Já em 1940, na companhia do novo marido, Geraldo Ferraz, volta para o jornalismo. Em 1941, tem o seu segundo filho, Geraldo Galvão Ferraz.
Os que se intitulam agitadores culturais culturais atualmente nada fazem de novo nessa função. Pagu já fazia isso quando fixou residência em Santos, ao incentivar grupos de teatro amadores.

Antes de morrer, em 1962, devido a um câncer, tentou o suicídio. Ela viajou a Paris para tratar a doença, mas a operação não obteve o êxito que se esperava. Desesperada, tentou se matar. Mas, será que ela queria mesmo morrer?

Aliás, acredito que se a pessoa quer mesmo se matar ela consegue. Se ela não foi capaz de concluir o ato com sucesso, é porque a vontade talvez não fosse tão grande assim.

Como escritora, desenvolveu suas ideias Parque Industrial (1933), com o pseudônimo Mara Lobo; e A Famosa Revista (1945), em colaboração com Geraldo Ferraz.

Com o pseudônimo King Shelter, escreveu contos policiais na revista Detective.

Mais uma informação para completar: foi Pagu quem trouxe as primeiras mudas de soja ao Brasil.

Eles falam de Pagu

Norma Bengell dirigiu o filme Eternamente Pagu em 1988.
Rudá de Andrade produziu um documentário sobre sua mãe.
O cineasta Ivo Branco, com o documentário Eh, Pagu, Eh! (1982)
No filme O Homem do Pau Brasil (1982), Pagu aparece como personagem.
Na minissérie Um Só Coração (Rede Globo, 2004), Miriam Freeland interpreta Pagu.
Livro Pagu: Vida e Obra, de Augusto de Campos (1982)
Pagu – livre na imaginação, no espaço e no tempo, de Lúcia Maria Teixeira Furlani (2001)
Livro Croquis de Pagu – 1929 – e Outros Momentos Felizes que Foram Devorados Reunidos, de Lúcia Maria Teixeira Furlani (2004)
Rita Lee e Zélia Duncan compuseram uma música que trata da mulher forte, vanguardista, que se alia às suas ideias e não ao seu corpo para conquistar o que almeja. Pagu é o título da canção, cuja letra está reproduzida abaixo:


Mexo, remexo na inquisição
Só quem já morreu na fogueira
Sabe o que é ser carvão
Uh! Uh! Uh! Uh!...
Eu sou pau prá toda obra
Deus dá asas à minha cobra
Hum! Hum! Hum! Hum!
Minha força não é bruta
Não sou freira
Nem sou puta...

Porque nem!
Toda feiticeira é corcunda
Nem!Toda brasileira é bunda
Meu peito não é de silicone
Sou mais macho
Que muito homem

Nem!Toda feiticeira é corcunda
Nem!Toda brasileira é bunda
Meu peito não é de silicone
Sou mais macho
Que muito homem...
Ratatá! Ratatá! Ratatá!Taratá! Taratá!...

Sou rainha do meu tanque
Sou Pagu indignada no palanque
Hanhan! Ah! Hanran!Uh! Uh!
Fama de porra louca
Tudo bem!Minha mãe é Maria Ninguém
Uh! Uh!...
Não sou atriz
Modelo, dançarina
Meu buraco é mais em cima

Porque nem!Toda feiticeira é corcunda
Nem!Toda brasileira é bunda
Meu peito não é de silicone
Sou mais macho
Que muito homem...
Nem!Toda feiticeira é corcunda
Nem!Toda brasileira é bunda
Meu peito não é de silicone
Sou mais macho
Que muito homem...(2x)
Ratatá! Ratatatá Hiii! RatatáTaratá! Taratá!...


Ufa! Depois de tudo isso, quem ousaria dizer que ela não teve importância?

domingo, 6 de junho de 2010

Para relembrar Pagu


Um dos principais nomes do movimento Modernista faria 100 anos no próximo dia 9 de junho.

Para celebrar a data e Patrícia Galvão, a Pagu, eventos começam a ser realizados nesta semana.

Na foto acima, Pagu ao lado do filho Rudá na praia, em Santos.
9 de junho, às 19 horas

Abertura Oficial das Comemorações
Local: Casa das Rosas
Av. Paulista, 37 - Bela Vista - São Paulo

A professora Lúcia Maria Teixeira Furlani (que já escreveu livros sobre Pagu e pesquisa a vida da modernista desde 1998) e atriz Miriam Freeland (que interpretou Pagu na minissérie Um só Coração, de Maria Adelaide Amaral e Alcides Nogueira) farão a leitura de cartas trocadas entre Pagu e personagens que revolucionaram o mundo das artes e da cultura no Brasil.

Na ocasião, Lúcia Maria vai falar sobre as várias fases de Patrícia, uma mulher de vida tumultuada, agitadora política e cultural de vários tempos.

“Afinal, quem era Pagu? Vamos passar por sua infância, pela adolescência quando já escandalizava as bem-pensantes famílias paulistanas com suas roupas e maquiagem, e até o seu romance proibido com o galã Olympio Guilherme. Em seguida, sua ‘adoção’ pelo casal Tarsila do Amaral e Oswald de Andrade, que terminou em novo escândalo quando Oswald de Andrade separou-se de Tarsila e acabou casando com a jovem normalista. O nascimento de seu filho Rudá, o encontro com Luiz Carlos Prestes, o ativismo político e até o final de sua vida,com a militância cultural, em Santos, casada com o escritor Geraldo Ferraz”, explica.

De 16 de junho a 18 de julho


Exposição Santos e Pagu
Local: Museu do Café
Rua XV de Novembro, 95, Centro - Santos
Horários: Seg. a Sáb. das 9h às 17h e Dom. das 10h às 17h // Bilheteria aberta até às 16h15
Ingresso: R$ 5,00 – Estudantes e pessoas com mais de 60 anos pagam meia

sábado, 5 de junho de 2010

Ana Cañas e o álbum Hein? *


Ana Cañas mudou. A cantora, que lançou em 2007 o primeiro CD, Amor e Caos, adotou uma levada mais rock'n roll no disco Hein?, lançado no ano passado.

Hein? foi preparado duarnte os dois anos em que Ana esteve na estrada para divulgar o primeiro disco, que continha apenas dez músicas. Para complementar o repertório, buscou canções de ídolos do rock, como Raul Seixas.

"As pessoas diziam que o CD era bom, mas o show era melhor. Comecei a me questionar a respeito disso. Percebi que os meus shows tinham mais atitude Eu era isso", relembra.

Mesmo com o rock mais presente no último trabalho, a cantora refuta qualquer rótulo. "Preocupo-me em ser verdadeira, em fazer boas músicas", diz. Hein? traz duas participações especiais: Arnaldo Antunes na canção Na multidão (composição dele com Ana e Liminha) e Gilberto Gil, que acompanha a cantora ao violão em Chuck Berry Fields Forever.

"Sou fã incondicional de ambos. Tenho muita sorte porque eles foram muito generosos".

Quem intermediou os encontros foi Liminha, que produziu o disco e compôs oito músicas ao lado de Ana, tornando-se um grande parceiro da cantora. Foi ele também que a apresentou a Dadi Carvalho.

"Dadi e eu temos muita facilidade para compor. ele cuida da harmonia e eu, da letra. No disco entraram apenas duas canções nossas (Caçando e Sempre Com Você), mas já fizemos umas oito, Ele é generoso, competente e companheiro", derrete-se.

Uma característica comum às canções de Hein? é o fato de serem mais abrangentes, menos introspectivas que no trabalho anterior. "Cantando um tema mais abrangente, acabo falando mais de mim. Estou mais intérprete", acredita.

Sendo um disco bastante autoral, é de se esperar que as composições sejam da cantora. Mas por que abrir exceção, ao gravar Chuck Berry Fields Forever?

"A letra é maravilhosa e questiona que rock é esse. Adoro as aliterações (repetição de consoantes) e a genialidade de Gil. Também não conhecia outras versões dessa música. Foi um desafio", justifica.


Brincadeira

O CD leva o nome Hein? porque cada vez que Ana falava sobre o trabalho, alguém lhe perguntava que nome daria ao disco. E ela respondia: Hein?, no sentido de como?

Como passar do tempo, percebeu que hein é também uma forma de comunicação. "A palavra expressa uma necessidade de troca. Você não fala hein se não quiser entender o outro", comenta.
* Original publicado no jornal A Tribuna em 16 de setembro de 2009.

segunda-feira, 31 de maio de 2010

Fernanda Takai e a sua versão Nara Leão: "Por causa dela, posso cantar com a minha voz"



Em 2006, a cantora Fernanda Takai mal sabia que o trocar de e-mails com o produtor musical Nelson Motta seria o esto- pim para uma grande mudança em sua carreira ­ e bemsucedida. Naquele ano, Motta deu a ideia de ela gravar um disco solo com canções de Nara Leão, produzido por John Ulhoa, marido de Fernanda. O resto da história todo mundo sabe: o disco Onde Brilhem os Olhos Seus, lançado em dezembro de 2007, foi sucesso de público e de crítica, assim como a turnê Luz Negra, cujo registro está nas versões CD e DVD.

A vontade de regitrar a turnê e o pedido do público pelas músicas que foram incluídas nas apresentações motivaram a cantora a lançar o trabalho, que fecharam o seu projeto solo. Atualmente, ela se dedica de forma integral à banda Pato Fu.

Todas as canções do trabalho solo em estúdio (Onde Brilhem os Olhos Seus) estão no DVD, com arranjos idênticos. "As pessoas gostaram das versões que fizemos e é isso que elas querem ouvir", justifica Fernanda.

A artista teve bastante liberdade para escolher as canções que complementaram Luz Negra. Quem poderia imaginar que ao lado de músicas de Nara Leão estariam Ordinary World, da banda inglesa Duran Duran, ou Ben, sucesso na voz de Michael Jackson?

"A princípio, as pessoas podem estranhar, mas escolhi canções que fazem parte da minha memória. Do tempo em que eu morei na Bahia, trouxe Sinhá Pureza (sucesso de Eliana Pittman). No extra do DVD, tem um clipe de Ritmo da Chuva, música da Jovem Guarda que a minha mãe ouvia muito. São canções que não daria para cantar com o Pato Fu".

Outra canção que se destaca é Kobune, versão japonesa de O Barquinho. A música foi introduzida no show a pedido do público, já que havia sido lançada por Fernanda no mercado japonês. Mesmo assim, a cantora pensou bastante antes de incluí-la no repertório.

"Queríamos mostrar a amplitude do trabalho de Nara Leão e não apresentá-la apenas como musa da bossa nova. No CD, já tinha Insensatez como representante da bossa nova. Mas o arranjo ficou bom, diluído (ao se juntar às demais canções), afirma.


Gravado no Teatro Municipal Manoel Franzem de Lima, em Nova Lima (MG) em maio de 2009, Luz Negra demandou tempo e trabalho. A pré-produção do DVD começou na primeira semana de março de 2009, com a seleção de imagens e de cinegrafistas que, como diz Fernanda, não são meros cãmeras, mas "diretores de vídeo".

"O DVD tem um olhar particular, mas não é um mero registro. O mercado ficou padronizado, eu quis fazer algo diferente, parecido com um filme. Fiquei surpresa com o resultado".

Após atoda a repercussão positiva em torno de sua carreira solo, incitada por Nelson Motta, o que representa Nara Leão para Fernanda Takai?

"Nara e eu temos um pedaço de história em conjunto. Pro meu lado pesa mais que para o dela. Talvez, em alguma biografia de Nata, escrevam, em uma linha, que em 2007, Fernanda Takai gravou um CD em homenagem a ela. Mas, na minha biografia, é um capítulo importante. Por causa dela, posso cantar com a minha voz. Nunca deixarei de falar sobre ela", diz.

* Adaptado do original publicado no jornal A Tribuna em 29 de julho de 2009.

quarta-feira, 26 de maio de 2010

Pedro Mariano e o seu CD, Incondicional


Alívio. Essa foi a sensação experimentada por pedro Mariano quando o seu último CD, Incondicional, foi liberado pela gravadora EMI. Em 2004, quando ficou pronto, novos diretores assumiram a grvadaora e não concordaram com o trabalho. Mariano gravou mais dois CDs, um deles ao vivo, mas nunca se esqueceu daquele trabalho que, em virtude da situação, tornou-se o seu xodó.

"Foram cinco anos de luta. Senti-me frustrado por não trabalhar um disco no qual eu acredito. Por isso, o escolhi para lançar o meu selo, Nau", afirma o cantor. Após uma nova mudança na diretoria, agora sob controle de Marcelo Castelo Branco, a EMI liberou o CD e ele recebeu o nome Incondicional que, para Marcelo, significa duradouro, eterno, pleno. Além disso, ele diz que "não mexeria nesse disco sob condição nenhuma".

O CD tem 13 faixas, a maioria composta por amigos de longa data do cantor, como Jair Oliveira (A Casa da Dor, Colorida e Bela, Memória Falha), Jorge Vercillo (Quase Amor) e Daniel Carlomagno (Procura, Inverno). Outra satisfação do cantor foi gravar músicas de Lulu Santos, Frejat e Samuel Rosa. "Mas hoje estou mais tendencioso a pesquisar gente nova", revela.

Mariano utiliza poucos recursos eletrônicos, que simulam os sons dos intrumentos. "O som tem que surgir a partir de um ser humano tocando. É quando ocorrem os improvisos. Posso usar bateria eletrônica, mas embaixo de uma base tocada", esclarece.

O cantor se empenha também no sucesso de seu selo, Nau. "Agora tenho a gerência sobre o meu marketing e sobre os locais nos quais preciso aparecer. Nas garavadoras, há equipes trabalhando de forma pasteurizada para todos. Isso não funciona bem", acredita.

* Adaptado do original publicado no jornal A Tribuna em 21 de julho de 2009.

terça-feira, 25 de maio de 2010

Biblioteca Mário Faria, o reduto cultural do Posto 6*


Os amantes da leitura, sejam eles turistas ou moradores de Santos, podem fazer uma pausa em sua caminhada pelo jardim da orla na Biblioteca Municipal Mário Faria, localizada no Posto 6. É lá que estão cerca de 12 mil exemplares disponíveis para empréstimo. São livros variados, que agradam a pessoas de todas as idades. Há obras infantis, romances, autoajuda, esotéricas, clássicas, religiosas e até de auxílio ao vestibulando. Além de livros, o local oferece jornais e revistas dos mais variados segmentos, para leitura no local.

Para fazer a retirada, basta cadastrar-se, levando comprovante de residência e um documento. O prazo para devolução é de dez dias, podendo ser renovado, inclusive por telefone, caso não haja nenhuma reserva. Entre os destaques, estão livros que encabeçaram a lista dos mais vendidos, como Cidade do Sol e O Caçador de Pipas, ambos de Khaled Hosseini. Para os turistas, a opção é trocar uma obra por outra, já que, por vezes, eles ficam menos de dez dias na Cidade.

Os números a respeito do funcionamento da biblioteca do Posto 6 são surpreendentes: 2 mil livros são retirados por mês para empréstimo, em média; 10.059 usuários foram cadastrados na unidade até dezembro de 2008 e 25.268 empréstimos foram realizados durante o ano de 2008. O número de empréstimos mensais gira em torno de 1.500 a 2 mil.

"As pessoas nos pedem sugestão de livros. A gente pergunta qual foi o último livro que a pessoa leu para ter uma idéia do que ela gosta", diz a bibliotecária Sueli Aparecida Lopes. Os livros são oriundos de doações e compra. No caso das doações, algumas obras são enviadas a outras unidades municipais. Já os livros machucados passam por restauro.

O aposentado Joaquim da Silva Gomes costuma frequentar a biblioteca. O foco de sua procura são jornais e revistas. "Gosto daqui. O ambiente é bom, as pessoas são gente finíssima. Saí de casa às 8h30 e cheguei antes da biblioteca abrir. Eu leio muito".


SERVIÇO:

A BIBLIOTECA FICA NA AVENIDA BARTOLOMEU DE GUSMÃO, S/Nº (EM FRENTE À RUA ALEXANDRE MARTINS, NO BAIRRO APARECIDA). O HORÁRIO DE FUNCIONAMENTO É DE SEGUNDA À SEXTA-FEIRA, DAS 9 ÀS 19 HORAS, E AOS SÁBADOS E DOMINGOS, DAS 9 ÀS 13 HORAS. O TELEFONE DE CONTATO É O 3231-8713.


Adaptado do original publicado no jornal A Tribuna em 26 de janeiro de 2009.

sábado, 15 de maio de 2010

Morre Toninho Dantas, aos 62 anos


Não conheci Toninho Dantas pessoalmente. Lembro-me de já tê-lo visto, mas não fomos apresentados nem o entrevistei.

Na verdade, eu teria a oportunidade se não fosse transferida do Caderno Galeria, de A Tribuna. Tirei férias em setembro do ano passado, bem no mês do Curta Santos, o festival de curtas metragens que Toninho Dantas capitaneou por 7 anos.

Sabe o que sobra? Um vazio. Daqueles em que você pensa: perdi a oportunidade de entrevistar, de conversar, trocar uma ideia...

A vida é tão curta, tão breve, e vai embora sem aviso... Às vezes, a gente acha que há tempo para tudo, mas quando ocorre uma morte como essa, repentina, você pensa: não há tempo. O tempo é agora!

Perde-se a oportunidade... Quando Plínio Marcos morreu, eu tinha 14 anos e nem sabia o que faria da vida. Mas sempre quando leio algo sobre ele, fica o gostinho: 'como teria sido se eu o entrevistasse?'. E é justamente essa a sensação que experimento com Toninho e com muito pesar, afinal eu parecia estar tão perto... Conversava demais com o Diego Santana, que assessorou o Curta Santos no ano passado. Quase todos os dias ele me ligava pedindo nota, divulgação...

Qualquer coisa que eu escrevesse sobre Toninho Dantas neste blog seria algo menor diante da grandiosidade e da importância dele para a cultura santista.

Por isso, prefiro dar voz aos amigos e às pessoas com as quais ele conviveu, porque trarão algo de novo a acrescentar à biografia deste gênio, nascido em Vicente de Carvalho, distrito de Guarujá, há 62 anos.
Vale conferir a entrevista que Toninho concedeu a Ricardo Prado, do site Cinecartógrafo, em março deste ano. Sempre com ideias fervilhando, ele deu pistas de como será o Curta Santos deste ano. Teria sido a última entrevista dele? Não sei.

Veja também a cobertura do site de A Tribuna.

sexta-feira, 14 de maio de 2010

Entrevista om Henrique Goldman, diretor do filme Jean Charles*


Um filme para celebrar a vida e mostrar como é o dia a dia dos imigrantes brasileiros em Londres. Esse foi o objetivo do diretor Henrique Goldman ao filmar Jean Charles, longa estrelado por Selton Mello, que mostra as dificuldades enfrentadas e também alguns trambiques cometidos por quem quer permanecer na capital inglesa. Jean Charles de Menezes é o eletricista brasileiro que foi morto pela polícia britância no metrô, ao ser confundido com um terrorista muçulmano, em 2005. Goldman lançou mão de não atores, inclusive pessoas próximas a Jean, como a prima Patrícia Armani e o ex-chefe Maurício Varlotta, que interpretam a si mesmos na trama. O filme ainda traz atuações de Vanessa Giácomo (Vivian), Luís Miranda (Alex) e participação de Daniel de Oliveira (Marcelo).

O ator Selton Mello fez questão de ir ao local em que Jean foi morto, mas parece que você não queria isso...
Eu queria que os atores vivenciassem as experiências dos personagens, mas não queria que ele pensasse muito na morte do Jean Charles. Queria que isso viesse para o Selton como elemento surpresa.

Como surgiu a ideia do filme?
Logo que o Jean foi assassinado, fiquei muito tocado. E como outros habitantes de Londres, pensei que isso poderia ter acontecido comigo, que sou brasileiro e, embora judeu, tenha cara de árabe. Depois de ouvir as mentiras da polícia sobre as razões que levaram os policiais a dar sete tiros, fomos conhecer os familiares de Jean. Contar a história virou uma necesssidade.

Que mensagem você espera que o filme transmita?
Eu quero que esse filme celebre a vida do Jean e das comunidades brasileiras no exterior.

Fale sobre 0 cuidado que vocês tiveram ao retratar a vida de uma pessoa que existiu.
O filme foi feito em colaboração com a família de Jean. Li oroteiro para os primos e para o irmão, e o filme foi mostrado quando o estávamos editando. Negociamos mudanças.

A participação de Patrícia Armani no filme traz um pouco mais de realidade à trama?
Sim. Houve uma troca de experiências muito importante entre a Patrícia e os outros não atores, que faziam o papel de si mesmos, e com os atores profissionais, que os ajudaram a atuar. Na verdade, os profissionais também foram ajudados a entrar nos personagens.

Quantos não atores participaram do filme?
Em papéis importantes, só a Patrícia e o Murício.

O seu desejo é que o filme passe a quem o assistir uma mensagem alegre...
É, o filme fala a respeito de uma tragédia, mas ao pesquisar a vida de Jean Charles descobrimos que ele era engraçado, mulherengo, gostava de piada e até um pouco picareta, no bom sentido da palavra.

O fato de Jean Charles ter se tornado uma pessoa conhecida garante público ao filme?
Eu acho que o público quer um bom filme. Só o que pode garantir a presença do público é a qualidade e o boca a boca.

* Adaptado do original publicado no jornal A Tribuna em 26 de junho de 2009.

sexta-feira, 7 de maio de 2010

Entrevista com Elton Medeiros, cantor e compositor*


Aos 8 anos de idade, Elton Medeiros compôs sua primeira canção. Mal ele sabia na época que se tornaria um dos grandes compositores de samba do País, e que teria entre os seus parceiros Cartola, Zé Keti, Paulinho da Viola, entre outros. Ainda criança, conheceu Heitor Villa-Lobos, regente do coral infantil no qual cantava. Mais tarde, tornou-se amigo de Pixinguinha. Com 79 anos de idade, o compositor carioca mostra vitalidade e lucidez com questões do passado e do presente. Na entrevista a seguir, ele fala sobre o cenário musical, seus grandes amigos, sua carreira e uma outra paixão: o Carnaval.

O senhor chegou a ser aluno de Pixinguinha na Escola Técnica João Alfredo, que frequentou na adolescência?
Não, fui amigo de Pixinguinha, apesar da nossa diferença de idade. Ele lecionava na escola, mas eu tocava saxofone barítono e ele era professor do curso de regional e ensinava violão, cavaquinho e flauta. Pixinguinha iniciava alguns alunos na arte de tocar choro, de acordo com a formação do Joaquim Antônio da Silva Calado: dois violões, um cavaquinho, uma flauta e um pandeiro.

Como vê a homenagem prestada a Pixinguinha por meio do Dia Nacional do Choro?
É um reconhecimento da importância dele como um executante maravilhoso da música brasileira, do choro. Ele foi um dos maiores flautistas do Brasil. Muita gente não o conheceu tocando flauta. Depois que ele sofreu enfarto, passou a tocar saxofone, porque não tinha mais embocadura para tocar flauta.

O senhor tem novos projetos pela gravadora Biscoito Fino?
Gravei meu último disco, Bem que Mereci, em 2006, pela Biscoito Fino. A Olívia Hime (dire- tora musical da gravadora) e a Maria Lúcia Rangel (jornalista) estão com um novo projeto para fazer um disco comigo. Estou aberto a qualquer possibilidade de trabalho. Foi muito prazeroso fazer o Bem que Mereci pela Biscoito Fino, com produção da Luciana Rabello e com músicas minhas cantadas por mim. Fiz uma homenagem ao Zicartola, uma casa de shows em que Cartola era mestre de cerimônias e Dona Zica cuidava da culinária.

O Zicartola foi caracterizado por um movimento musical também, né?
O Zicartola foi um reduto de resistência política e cultural. Ele surgiu em uma época política muito conturbada e, naquela época, você ligava o rádio e só ouvia iê-iê-iê e bolero. Quando você percebe dois gêneros alienígenas tomando conta da programação de um país, você tem a sensação de que este país está acabando, que sua cultura está se esvaindo. Os pessimistas achavam que não tinha jeito. Eu achava que tinha jeito, mas me perguntava: que jeito vai ter e quando vai ter? Será que verei a música brasileira reagir ao iê-iê-iê e ao bolero? Mal sabia eu que participaria de um movimento, o Zicartola, que fez ressurgir a gafieira, as rodas e as casas de samba. O João do Vale cantava música nordestina e a Clementina de Jesus, partido alto, lundu e jongo.

E hoje, existe um movimento parecido com o Zicartola ou os músicos estão mais apáticos?
Notamos que há de um lado uma juventude muito alienada e de outro, uma muito interessada em aprender e preservar a cultura brasileira. Há uma juventude imensaestudando música. Os alienados são produto das ideias que a mídia impõe, por meio da televisão e do rádio: o tipo de música, de comportamento e composição fora da realidade brasileira.

A sua primeira composição gravada foi Falta de Queda, uma parceria com Ari Valério, pelo Jamelão, em 1958. Só depois que o senhor veio a gravar as suas composições...
Eu não me considero cantor. Depois que Jamelão gravou, a escola de samba Aprendizes de Lucas gravou uma música minha, depois outros cantores começaram a gravar como Elizeth Cardoso e Dalva de Oliveira.

O senhor fundou três escolas de samba (Tupi de Brás de Pina, Unidos de Lucas e Quilombo) e é um dos padrinhos da ala de compositores da Portela. O Carnaval mudou nas últimas décadas?
O Carnaval é mutante mesmo. Sofre influência, às vezes danosa, da mídia e assimila elementos alienígenas, que são da cultura brasileira, mas não têm nada a ver com a cultura da região. E assimila por força da divulgação dessas culturas pelo rádio, pela televisão e pelos discos. A mídia se encarregou de mesclar o Carnaval do Rio com outras manifestações, que não eram carnavalescas.

O senhor sempre teve ao seu lado grandes parceiros nas composições, como Cartola, Zé Keti e Paulinho da Viola. Há alguma curiosidade sobre eles para contar?
Eles já são a própria curiosidade. A cada encontro e em cada música, as curiosidades ocorriam em cada verso, em cada trecho melódico.

O senhor teve contato com Heitor Villa-Lobos quando cantava no coral infantil regido por ele...
Nunca tive contato direto com a pessoa Heitor VillaLobos. Ele regia lá e eu cantava aqui. Já o Pixinguinha foi meu amigo, eu frequentava a casa dele e gostava de conversar com ele. Várias vezes saí da minha casa ou do meu trabalho para ir ao Bar Gouveia conversar com Pixinguinha. Jamais conversei com Villa-Lobos, mas foi por falta de oportunidade de me aproximar. Talvez eu tivesse um respeito exagerado. Ele não ia dar bola a um garoto de canto orfeônico.
*Adaptado do original publicado no jornal A Tribuna em 5 de maio de 2009.

quarta-feira, 5 de maio de 2010

John Pizzarelli, um velho caso de amor com a MPB


Em sua última visita ao Brasil, em meados de 2009, onde realizou shows em São Paulo e em Santos para a turnê do With a Song in My Heart (2008), o cantor e guitarrista norte-americano John Pizzarelli reiterou o seu amor pela música brasileira. Ele, que gravou o CD Bossa Nova (2004), não descarta realizar outra gravação em homenagem à MPB.

"Penso em fazer um novo trabalho com música brasileira, mas não sei se em CD ou em DVD. Seria gravado no Brasil. Pretendo convidar artistas para tocar comigo", revela.

E quem seriam esses artistas? "Os que disserem sim", brinca Pizzarelli, demonstrando bom humor, para depois emendar com nomes de peso. "Milton Nascimento, Toninho Horta, Chico Buarque, João Bosco...", diz ele, que também é fã de João Gilberto.

Aliás, o CD With a Song in My Heart, homenagem ao músico e compositor norte-americano Richard Rodgers, conta com a participação de César Camargo Mariano no piano.

No entanto, não se pode afirmar que a música brasileira fará parte do próximo trabalho do norte-americano, já que nem ele sabe o que ou quem irá homenagear. "Tenho muitas ideias. Não sei se será sobre um compositor. Não há nada definido", afirma Pizzarelli, que já homenageou grandes nomes da música internacional, como o grupo The Beatles, Nat King Cole, que julga ter sido o culpado por ele seguir a carreira artística, e Frank Sinatra, para o qual abriu um show ainda no início da carreira.

"Foi ótimo tocar com o maior músico (Sinatra), usufruindo da qualidade e da melhor estrutura (técnica)", rememora ele, que admira também Billy Joe, James Taylor e Tony Bennett.

(Nota: O mais recenete trabalho de Pizzarelli, Rockin' in Rhythm (2010) é um tributo a Duke Ellington, compositor de jazz morto em 1974)


TALENTOS

Além de músico, Pizzarelli se aventura na carreira de radialista, com o seu Radio Deluxe With John Pizzarelli, programa no qual, além de tocar músicas, recebe convidados especiais para um bate-papo e para tocar ao vivo. Já estiveram com ele Liza Minnelli, Regis Philbin, Peter Cincotti, entre outros. A atração éco-apresentada pela mulher de Pizzarelli, Jessica Molaskey.

"É ótimo tocar no rádio as músicas que gosto. Me divirto muito. Ninguém diz o que eu devo tocar, é tudo bem informal", conta ele, que afirma ainda não ter se descoberto como um comunicador.

As impressões de Pizzarelli sobre o público brasileiro e, em especial, o de Santos não poderiam ser diferentes. Na cidade, ele chegou a afazer um show em benefício do Educandário Santista e do Albergue Noturno.

"Fico feliz de vir a Santos porque as pessoas conhecem meus discos, além do público comparecer em maior número que nos lugares nos quais costumo me cantar. Também não posso deixar de destacar a paixão que o povo daqui tem pelo futebol", finaliza.

* Adaptado do original publicado no jornal A Tribuna em 9 de julho de 2009.

terça-feira, 4 de maio de 2010

Entrevista com Daniela Thomas, cineasta e cenógrafa*


Cenógrafa, roteirista, cineasta. Premiada em todas as áreas nas quais atuou. Engana-se quem pensa que Daniela Thomas já fez de tudo. Pelo contrário, ela está cheia de projetos e em todos sente-se como uma novata, com muita energia e pronta para novas descobertas. Filha de Ziraldo e esposa do diretor de teatro e dramaturgo Gerald Thomas, respira arte desde a infância.

O trabalho como cenógrafa ajudou as suas demais atividades?
A facilidade de pular de uma área para a outra está relacionada à maneira pela qual fui criada, no estúdio do meu pai (Ziraldo), que é jornalista, autor infantil e adulto, um show man. Nesse estúdio era muito feliz e não havia distinção entre adulto e criança. Fui influenciada por essa liberdade de criar. A cenografia me deu uma preocupação estética apurada. Mesmo que uma cena esteja emocionante, deve haver (em mim) uma quedinha pelo melhor enquadramento.

Credita-se a Central do Brasil o renascimento do cinema nacional. Você concorda?
Eu acho que sim. O Central acendeu a luz do Brasil no exterior e para os brasileiros. Fez as pessoas despertarem para um filme feito, criado e desenhado no Brasil; que emocionaria e traria novas reações a um público acostumado com o cinema americano. Também abriu as portas para Cidade de Deus, Tropa de Elite e para outros filmes, inclusive o Linha de Passe.

Você acredita que existe preconceito com o cinema nacional?
Cada vez menos. Conversando com o pessoal do Espaço Unibanco, perguntei o que as pessoas estão vendo e me disseram que nessa semana só dava Se eu Fosse Você 2 e Divã. Estamos tentando encontrar a nos- sa voz, ao mesmo tempo criativa, original e que converse com o público. Não fazemos cinema americano e nem queremos, o que é legal. É um cinema cada vez mais próprio, particular. Somos a primeira geração de autores livres, o cinema vai ficar cada vez mais bacana.Linha de Passe deu o prêmio de Melhor Atriz no Festival de Cannes para Sandra Corveloni... O Festival de Cinema de Cannes recebe de 2 a 5 mil filmes por ano. Ser selecionado entre os 22 que competem já é ótimo. Quem seleciona são pessoas muito criteriosas e conhecedoras de cinema. São mestres da sétima arte. Eles estão muito antenados com a gente. Estão aguardando o nosso cinema.

Conta um pouquinho sobre a parceria com Walter Salles.
A gramática do cinema para o Walter é a coisa mais natural do mundo, como construir uma série de planos que se encaixam e potencializam a emoção de uma cena. Para mim, isso é muito difícil. Tenho mais facilidade de criar um momento emotivo, de lidar com os atores, de criar as sequências, os momentos de emoção do ator. Esse casamento profissional é muito azeitado. Eu me meto muito na câmera e o Walter, com os atores. É difícil dizer onde uma pessoa começa e onde a outra termina. Nosso cinema é colaborativo.

Como está o mercado para quem quer seguir carreira no cinema?
Melhor que nunca. A comunicação é a coisa mais importante que existe e o mercado só faz aumentar. Lógico que quanto mais competição, mais difícil é, mas acho que estamos em um bom momento para quem quer participar do grande boom do vídeo, do cinema, do
teatro e dos eventos. Mas é preciso ter vontade e infinita curiosidade. Fazer perguntas é tão bacana quanto responder. Não perguntar o óbvio e buscar respostas diferentes.

*Adaptado do original publicado no jornal A Tribuna em 2 de maio de 2009.

segunda-feira, 3 de maio de 2010

Profeta Gentileza - Parte III


Vocês não imaginam como é maravilhosa a troca de informações que o blog tem me proporcionado. E é levando em consideração os comentários que resolvi fazer mais umpost sobre o Gentileza. Sim, o assunto está rendendo e, na verdade, merece espaço.
Como bem lembrado pelo blogueiro Fábio Whitaker, o Profeta Gentileza foi homenageado pela Acadêmicos do Grande Rio em 2001, por meio do enredo Gentileza X, O Profeta do Fogo. Um dos mais conceituados carnavalescos do Rio de Janeiro, Joãosinho Trinta, havia acabado de chegar à escola com a missão de fazer um carnaval inesquecível, que sua mente genial seria capaz de proporcionar. Não venceu o Carnaval (ficou em 6ºlugar), mas nem por isso a homenagem ao senhor que andava pelas ruas pregando palavras de amor e respeito ao próximo foi ofuscada e até hoje aquele desfile é lembrado com muito carinho.


"A comissão de frente já veio pegando, representando os astronautas do milênio, e a Grande Rio já começou aí a mostrar como seria o carnaval. O João preparou um carro especial para a Valéria Valença, em que havia uma grua que levava a eterna Globeleza até a arquibancada, até os camarotes. O público delirava", lembrou o diretor de caranval da escola, Milton Perácio, em entrevista ao G1 este ano.


E quem não lembra do astronauta norte-americano Eric Scott levantando voo em plena Sapucaí? Foi desse Carnaval também."Eu acho que vai ficar difícil a Sapucaí ver uma atração como essa, um show como esse por muito tempo. Não houve ensaio. Não havia perigo, ele já era acostumado a isso. A Grande Rio entrou para a história do carnaval depois disso", continuou Perácio.


A seguir, a sinopse do enredo e a letra do samba.


SINOPSE

No alvorecer do III Milênio e em plena Era Espacial, é o exato momento do homem contemplar as mensagens de seres iluminados. Em Niterói, aconteceu a Tragédia de um Circo Destruído pelo Fogo. Dizem, entidades espíritas, que foi o resgate de vidas passadas na Roma Pagã. Abalado com esta notícia, um empresário chamado José Datrino ouviu vozes chamando-o para uma missão espiritual. Ele era um homem atribulado por todos os problemas atuais. Como todos nós, ele estava vivenciando a Idade Média de nossos dias. Vendo o Povo sofrendo, despojou-se de suas riquezas e começou sua peregrinação. Foi chamado de louco e poeta. Plantou flores e distribuiu vinho no local daquele sofrimento. Imortalizou nas Pilastras do Viaduto uma Sabedoria Universal. Começou suas Pregações dizendo: Gentileza gera Perfeição, Bondade a Natureza Amor, Beleza e Riqueza. E com a vibração da Era de Aquarius a Grande Rio pede benção ao Profeta Gentileza com afeto, carinho e emoção. Agradecido meu irmão.

SAMBA ENREDO
Compositores: Carlos Santos, Cláudio Russo, Zé Luiz e Ciro

Novo Milênio
Avança O Homem Para O Espaço Sideral
Em Busca De Mensagem Positiva
Valorização Da Vida, O Amor Universal
Na Arena, Alegria E Dor
Triste Legado Que Roma Pagã Deixou..
Ô..Ô..Ô..Ô.
Pelas Vozes Foi Guiado O Arauto Iluminado
A Mudar O Seu Destino
Renuncia A Ambição
Ao Seguir A Intuição
José Datrino.

Deixa Clarear...
Idade Média Nunca Mais...
Gentileza Anuncia
No Raiar Do Novo Dia
Um Clamor De Amor E Paz

Das Flores A Beleza
Para O Mundo Recriar
O Vinho É A Vida
É Preciso Festejar
Considerado Louco
O Poeta Foi Bem Mais
Deixando Nas Pilastras
As Palavras Imortais
Com A Sabedoria Universal
Pregava Contra O Mundo Desigual
Gentileza Gera Perfeição
Violência Não

Era De “Aquarius”...
Tempo De Amor
A Grande Rio...Iluminou
Profeta Faz Nascer
Do Fogo Alvorecer
Irmão Sol A Verdade É Você

domingo, 2 de maio de 2010

Profeta Gentileza - Parte II


Já que este blog também é construído pelas pessoas que o leem (muito obrigada a todos pelos comentários a respeito do post do Gentileza), darei continuidade ao último assunto aqui abordado.

Em agosto de 1997, a Companhia de Limpeza Urbana do Rio de Janeiro passou uma demão de tinta cinza nos escritos de Gentileza. O motivo alegado: estava retirando as pichações da Cidade. Essa atitude inspirou a canção escrita por Marisa Monte, em protesto.

Dezoito meses se passaram até o início da remoção da tinta e recuperação dos registros. A restauração foi iniciativa da Universidade Federal Fluminense e terminou em 2000.

Como a pintura era do tipo caiação, o método utilizado para a remoção foi lavagem com água de pressão e sabão neutro. Em duas pilastras, havia grafite por cima dos escritos. Nelas, foi necessário fazer decapagem manual para recuperação dos escritos.

O decreto nº 19.188, de 27 de novembro de 2000, assinado pelo então prefeito do Rio de Janeiro, Luiz Paulo Conde, determinou o tombamento de todas as pinturas e escritos de autoria de José Datrino. Qualquer intervenção nas pinturas deve ser autorizada previamente pelo Conselho Municipal de Proteção do Patrimônio Cultural do Rio de Janeiro.


Como já constava na postagem anterior, Marisa Monte gravou a música Gentileza, de sua autoria, no disco Memórias, Crônicas e Declarações de Amor (2000). “O Gentileza tinha deixado mensagens escritas nos pilares de um viaduto. Chamei o Brown e disse que ia mostrar algo chocante. Quando chegamos lá, fiquei muito triste em ver que haviam passado cal por cima, apagando as mensagens. No dia seguinte, escrevi a música. Foi bastante sintomático o fato dessas mensagens de sabedoria serem encobertas em um momento em que o Rio de Janeiro anda tão violento”, disse em uma entrevista dada na época.

Outro que também homenageou Gentileza foi o cantoe e compositor Gonzaguinha, ainda na década de 1980, com uma canção também chamada Gentileza.

Abaixo, seguem as letras
Gentileza (Gonzaguinha)
Ouça a música em http://www.youtube.com/watch?v=2xVHotybpmw





Feito louco
Pelas ruas
Com sua fé
Gentileza
O profeta
E as palavras
Calmamente
Semeando
O amor
À vida
Aos humanos
Bichos
Plantas
Terra
Terra nossa mãe.


Nem tudo acontecido
De modo que se possa dizer
Nada presta
Nada presta
Nem todos derrotados
De modo que não de prá se fazer
Uma festa
Uma festa.


Encontrar
Perceber
Se olhar
Se entender
Se chegar
Se abraçar
E beijar
E amar
Sem medo
Insegurança
Medo do futuro
Sem medo
Solidão
Medo da mudança
Sem medo da vida
Sem medo medo
Das gentilezas
Do coração.
Feito louco pelas ruas...


Gentileza (Marisa Monte)
Veja o clipe em: http://www.youtube.com/watch?v=mpDHQVhyUrY

Apagaram tudo
Pintaram tudo de cinza
A palavra no muro
Ficou coberta de tinta
Apagaram tudo
Pintaram tudo de cinza
Só ficou no muro
Tristeza e tinta fresca

Nós que passamos apressados
Pelas ruas da cidade
Merecemos ler as letras
E as palavras de Gentileza

Por isso eu pergunto
À você no mundo
Se é mais inteligente
O livro ou a sabedoria

O mundo é uma escola
A vida é o circo
Amor palavra que liberta
Já dizia o Profeta

sexta-feira, 30 de abril de 2010

Gentileza - Uma voz pela solidariedade

Cinquenta e seis murais pintados em pilastras de concreto do Viaduto do Caju, no Rio de Janeiro, trazem a mensagem de alguém que foi mal-interpretado por muitos na época em que peregrinava pelas ruas com seu estandarte, mas que hoje é visto como profeta: José Datrino, o Gentileza. Em uma extensão de 1,5 quilômetro, seus escritos formam um grande livro urbano, com sequência lógica. A confecção começou nos anos 80 e terminou no início da década seguinte.

É esse personagem carioca que Glória Perez homenageou na novela Caminho das Índias, na qual José Datrino é interpretado por Paulo José. Aliás, a autora aproveitou os escritos deixados pelo profeta para compor o texto da trama.

Com o mote "gentileza gera gentileza", o profeta, mesmo após sua morte, em 1996, mostra ao mundo que suas mensagens são atuais. Mais do que nunca, as relações humanas precisam ser mais fraternas.

"Gentileza era um sábio, tinha uma percepção da realidade diferente da nossa. E era um místico também. Todos os profetas não foram reconhecidos emsua época", afirma Leonardo Guelman, professor do Departamento de Arte da Universidade Federal Fluminense, coordenador do projeto Rio com Gentileza e autor dos livros Univvverrsso Gentileza (Editora Mundo das Ideias) e Brasil Tempo de Gentileza (Editora Eduff).


IDENTIFICAÇÃO
Paulo José não poderia estar mais feliz ao interpretar Gentileza. "Gravei na rua, na Cinelândia, na Rodoviária, enfim, no Centro do Rio. As pessoas aplaudiam porque o personagem despertava muita simpatia", afirma.

Para compor o personagem, Paulo José leu textos e obras a respeito de Gentileza, além dos próprios escritos de Datrino. Aliás, os relê sempre. "Ele gostava de repetir vogais e consoantes, e isso o tornava engraçado. Ele dizia que amorrr (com três erres) era o amor universal e vvvida (com três vês) uma existência superior e não a comum", conta o ator.

"Parecia um louco, mas na verdade era revoltado contra o egoísmo. Dizia coisas contundentes em relação ao capital, ao qual chamava de capeta", finaliza Paulo José.

MANIFESTAÇÕES CULTURAIS
Sobre Caminho das Índias, Guelman afirma que ficou feliz ao saber que o ator Paulo José havia sido escalado para dar vida ao Gentileza. "Devemos entender o Gentileza além do maluco beleza. A novela difundiu a sua mensagem para outros lugares do País". No Rio, está na moda vestir a camiseta com a frase Gentileza Gera Gentileza.

No disco Memórias, Crônicas e Declarações de Amor (2000), Marisa Monte gravou a música Gentileza, desua autoria, que homenageia o profeta. O livro de Guelman, Univvverrsso Gentileza, já foi adaptado para o teatro, com direção de Júnior Perim e Vinícius Daumas, e o roteiro de Gambo Júnior. Além disso, Dado Amaral e Vinícius Reis dirigiram o curta Gentileza, em 1994.

Biografia

José Datrino nasceu em Cafelândia (SP) em 11 de abril de 1917, e até os 20 anos trabalhou como lavrador. Desde os 12 anos, achava que teria família, filhos e bens, mas em 1937, foi para São Paulo e durante quatro anos não deu notícias. Depois, migrou para o Rio de Janeiro, casou-se e teve cinco filhos. Estabeleceu-se com uma transportadora, mas a partir de uma revelação, após a queima de um grande circo em Niterói, assumiu uma nova identidade: Jozze Agradecido, ou Gentileza. Foi internado em clínicas psiquiátricas, e nesses locais fazia a sua pregação. Nos anos 60, apresentava-se como representante de Deus, anunciando um novo tempo, e aos poucos tornou-se figura popular. Nunca aceitou dinheiro, mesmo assim rodou por todo o País e ficou ainda mais conhecido. Nos anos 70, percorreu vários jornais para levar a sua palavra. Nos anos 80 e 90, pintou os painéis que o consagraram. Faleceu em 29 de maio de 1996, aos 79 anos.

FONTE: BRASIL TEMPO DE GENTILEZA, DE LEONARDO GUELMAN


* Adaptado do original publicado no jornal A Tribuna em 14 de abril de 2009.

terça-feira, 27 de abril de 2010

As obras de André Vianco


Conhecido por suas histórias recheadas de mistério e aventura, que atraem a atenção dos jovens, o escritor André Vianco fala um pouco sobre o seu 13º livro, O Caminho do Poço das Lágrimas, editado pela Novo Século.


Embora a obra tenha se originado de uma história de ninar que contava a suas filhas, o autor diz que os elementos do enredo, trabalhados durante quatro meses, atraem um público diversificado. Definindo-se como um escritor gótico, Vianco diz que a melancolia presente em outras obras suas está na atual, que é uma fábula.

"Há um questionamento sobre a nossa finitude, a morte e a importância do contato com as pessoas. O livro procura mostrar que morrer é mais natural do que nascer. Portanto, não fique preocupado com o dinheiro, com o possuir. Após a morte, só levamos sentimentos".

O desenrolar da história de O Caminho do Poço das Lágrimas é imprevisível. "As pessoas que leram o livro disseram que o final é impactante. Não era para ser uma obra de suspense, mas os leitores sentiram isso".


De olho nos jovens

Segundo Vianco, a literatura compete com os jogos de RPG, os videogames e a internet. "O público jovem brasileiro se encanta muito com causos, tipo a história do padre que vira lobisomem. Nós temos a tradição de contos populares de fantasia, e tento inserir isso na literatura".

Em 1998, Vianco escreveu o primeiro livro, O Senhor da Chuva, e em 2000 publicou a obra Os Sete, de forma independente, já que as editoras não apostavam nesse mercado (histórias de terror e fantasia).

Em 2001, o sucesso do livro lhe abriu as portas da Editora Novo Século, onde já vendeu mais de 400 mil exemplares. "Minha obra é focada na aventura, no mistério, e não no terror, embora eventualmente ele possa aparecer", diz o escritor, que durante três anos se dedicou às histórias de vampiros.


Cinema

Mesmo engajado na literatura, Vianco não deixa de lado sua outra paixão: o cinema. Ele quer transformar um de seus nove romances em longametragem. O processo está em fase de captação de recursos por meio da Lei Rouanet. Quem quiser conhecer melhor o trabalho de Vianco como diretor pode acessar o site www.youtube.com.br/andrevianco.

Site oficial: www.andrevianco.net/



Adaptado do original publicado no jornal A Tribuna em 22 de novembro de 2008.

segunda-feira, 26 de abril de 2010

Em Santos, Surpresa em Dobro na Sessão Desconto do Cinemark


A comédia Surpresa em Dobro, dirigida por Walt Becker e protagonizada por John Travolta e Robin Willians, está em cartaz na Sessão Desconto da Rede Cinemark no Praiamar Shopping. Até 29 de abril, sempre às 15h, o espectador poderá assistir ao longa na promoção pagando apenas R$ 4 (inteira) e R$ 2 (meia) pelo ingresso, em qualquer dia da semana – incluindo sábado e domingo.
Dan (Robin Williams) e Charlie (John Travolta) são dois amigos e sócios que têm suas vidas viradas de ponta-cabeça, quando precisam cuidar, por duas longas semanas, de dois gêmeos de seis anos de idade.

Serviço
Praiamar Shopping: Rua Alexandre Martins, 80 – Aparecida

domingo, 25 de abril de 2010

Bruna Caram, o frescor de uma jovem cantora


Ontem, fui ao show de Bruna Caram no Sesc Santos. Como já conhecia algumas músicas, esperava ver o que os vídeos no Youtube já haviam me mostrado. Mas a jovem cantora, de apenas 22 anos, parece guardar um mistério que aos poucos ainda será revelado.

Embora apresente uma boa desenvoltura ao cantar (e não apenas cantar, mas interpretar a letra - o que já é um diferencial se considerarmos a massificação do meio musical), ela ainda parece tímida ao conversar com o público, ao agradecer a presença. Tímida, porém feliz. É um charme, sem dúvida.

Voltando aos dotes artísticos da moça, vale a pena conferir. Sua voz delicada e bem afinada atinge notas altas de uma forma que aos leigos parece muito difícil.

No repertório de seu atual show, Feriado Pessoal, há de tudo: músicas alegres, músicas lentas, que falam de amor, ou que simplesmente narram o cotidiano de uma pessoa comum. Para quem gosta de releituras, vale prestar atenção em Fera Ferida (Roberto Carlos/ Erasmo Carlos) e Quem Sabe Isso Quer Dizer Amor (Lô Borges/ Márcio Borges).

Quatro músicos acompanham a cantora no show, cujo cenário é bem simples: uma rotunda de retalhos de tecido, nada mais.

Muita gente poderia pensar como uma garota de 22 anos parecer ter tanto apuro, preparo musical e talento? A resposta: ela não é nenhuma novata. Bruna canta profissionalmente desde a infância, quando fez parte do grupo Trovadores Mirins (versão infantil dos Trovadores Urbanos), dos 7 aos 18 anos. Sua avó, Maria Piedade, era cantora e sua família promovia saraus e rodas de choro.

Bruna já lançou dois álbuns pela Dábliu: Essa Menina (2007) e Feriado Pessoal (2009).
Saiba Mais:
Site oficial: www.brunacaram.com.br/

quinta-feira, 22 de abril de 2010

Entrevista: Maurício Ianês *

Já que neste ano haverá a 29ª Bienal de São Paulo (de setembro a dezembro, no Parque do Ibirapuera), que tal relembrar o artista plástico que chamou a atenção do pavilhão na última edição ao ficar nu, na performance A Bondade de Estranhos? A seguir, uma entrevista bem bacana com Maurício Ianês.

Destaque da 28ª Bienal de São Paulo, realizada em 2008, o artista plástico santista Maurício Ianês, chamou a atenção e causou espanto em muitos visitantes com a performance A Bondade de Estranhos, que apresentou de 4 a 16 de novembro daquele ano. Tudo por conta de sua nudez, utilizada como parte do processo do trabalho.

Durante a performance, Ianês não pôde se comunicar com ninguém, dormia no prédio da Bienal e tomava banho no vestiário do pavilhão. Sem roupas, comida ou bebida, ele dependia das doações do público. Não foi a primeira vez que o artista ficou nu em performances.

Em 2007, na Galeria Vermelho, da qual faz parte do casting, apresentou a performance Zona Morta, no festival Verbo. Durante três horas, ele permaneceu deitado no chão, nu e coberto por 16 quilos de glitter dourado. Em entrevista por e-mail, o artista fala sobre a experiência na Bienal, a sua carreira no mundo da moda e a relação com Santos.

Como surgiu a idéia de ficar nu na 28ª Bienal de São Paulo? O que pretendia?
Ficar nu fazia parte do processo do trabalho, mas nunca foi a idéia central dele. A proposta era chegar à Bienal completamente desprovido de quaisquer bens e em silêncio absoluto, deixando ao cuidado do público a minha sobrevivência por meio de doações. Eu me transformaria num espelho das ansiedades, dos desejos e das necessidades do público. O trabalho também pretendia tecer uma rede de relações sociais mantidas sem o uso da linguagem, e isso também aconteceu. No final, as pessoas se apropriaram do espaço criado, tornando-o um lugar de encontros, conversas, onde eu ficava apenas de mediador silencioso. Por vezes, foi difícil ficar calado, mas me acostumo fácil ao silêncio.

Como você encara as doações feitas pelos visitantes da Bienal? O brasileiro é solidário?
Isso foi incrível. Recebi não só alimento, bebida e roupa, mas também cartas de encorajamento. Não acho que esse trabalho seja uma boa medida para analisarmos a solidariedade do brasileiro, pois ele estava contextualizado dentro da Bienal. Sei, no entanto, que muita gente passou a repensar as suas atitudes em relação à pobreza e à vida na rua depois desse trabalho. Sei disso por meio das cartas que me foram doadas.

Quantas doações foram feitas? Qual foi a mais esquisita?
Não sei exatamente quantas peças foram doadas, ainda não as contei. Um dos princípios do trabalho é que eu não julgaria as peças doadas. Posso falar quefiquei muito felizcom uma marmita quente de arroz e vegetais assados. Quando abri e vi a refeição, quase chorei, eu quesouvegetariano.

Achava que sua performance geraria tanta repercussão?
De modo algum. Fiquei chocado.

Quem ainda vai à bienal, pode conhecer o seu trabalho por meio da exposição Área de Silêncio/Área de Monólogo/ Área de Diálogo - uma instalação composta por três peças de vinil adesivo preto cortadas a laser e coladas no chão. O que representa?
Esse trabalho é composto por espaços delimitados no chão, cada um com a sua forma e ligado à área respectiva (silêncio, monólogo e diálogo), que estão ali para serem ativados pelo público, ou criarem a expectativa de ativação.

Como a moda surgiu na sua vida?
Por acaso. Conheci Alexandre Herchcovitch na faculdade, ficamos amigos e acabamos dividindo uma casa. Comecei a me meter nos seus trabalhos de faculdade e faço isso até hoje, só que profissionalmente.

Como foi trabalhar com a direção de criação da Zapping e da Authentic Vision Brasil (AVB), além de ter sido consultor de estilo de Walter Rodrigues e ser colaborador de Alexandre Herchcovitch?
Minha experiência com a Zapping começou como um dos projetos mais interessantes que eu trabalhei, mas infelizmente terminou numa das situações mais desgastantes da minha vida. AVB foi um projeto interessante que também foi abortado. Trabalhar com o Walter foi um grande prazer, ele é um estilista muito especial. E o meu trabalho com o Alexandre é uma grande experiência. Temos liberdade de pesquisa e criação.

Durante seis meses, você participou de uma residência na Cité Internationale des Arts, em Paris, e por dois meses esteve no Quartier 21, em Viena. O que fez na França e na Áustria?
Foram duas residências artísticas que tive esse ano. Foram bolsas de trabalho que recebi, com ajuda de custo local para morar e desenvolver meus projetos artísticos. As duas experiências foram muito enriquecedoras, especialmente a da França, pois no final participei de uma exposição na Galerie Vallois, em Paris.

Qual a sua relação com Santos, além de ter nascido na Cidade? Faz visitas com frequência?
Saí de Santos aos 18 anos para morar em São Paulo e estudar. Guardo boas lembranças da Cidade, que já visitei mais. Mas agora, saindo da Bienal, preciso recarregar as minhas baterias com a minha família, andar na praia no final de tarde e sentar próximo ao mar para ler na Ponta da Praia. Adoro o Orquidário também. Ele ainda funciona? Espero que sim.

* Adaptado do original publicado no jornal A Tribuna em 24 de novembro de 2008.

quarta-feira, 21 de abril de 2010

Gabriel Villela faz a sua versão de Calígula, clássica e sem atores nus*


Calígula - o implacável imperador romano que perde os limites do poder, da liberdade e da razão após a morte de sua irmã e amante Drusilla - está de volta ao teatro. Desta vez, a obra do escritor franco/argelino Albert Camus (1913-1960) foi montada com texto do dramaturgo e jornalista Dib Carneiro e direção de Gabriel Vilella. Thiago Lacerda interpreta o imperador.


"Não há no Brasil nenhum ator com mais capacidade física, inteligência ou juventude do que Thiago para chegra fazer um minotauro em cena, como é o Calígula", diz o dirtor sobre a escolha. O convite para ser o protagonista da epça chegou a Thiago por meio da atriz Walderez de Barros, que preparou vocalmente o elenco.


"Eu estava buscando, para minha carreira, alguma coisa que fosse como o Calígula, mas não sabia como isso ia acontecer. Precisava de outro tipo de papel que ainda não havia feito, queria vasculhar outros caminhos", arremata o ator. "O convite me encheu de prazer e orgulho. Me senti desafiado e topei de imediato a empreitada. O momento pelo qual estou passando tem sido revelador".


Completam o elenco Magali Biff (Cesônia), Pascoal da Conceição (Cherea), Jorge Emil (senador romano e Ruffus, poeta), Rodrigo Fregnan (Hélicon), Pedro Henrique Moutinho (Scipião, poeta) e Ando Camargo (intendente do tesouro romano e Metellus, poeta).


Sem Nudez


Ao contrário do filme Calígula (1980) e da montagem teatral brasileira com Edson Celulari, na década de 90, a nova versão não terá artistas nus no palco, nem cenas de orgias. De acordo com o diretor, o texto de Carneiro Neto não pede esse tipo de exposição.


"A peça trata de um outro contexto. Não existe a possibilidade de qualquer ator tirar a roupa. Na verdade, eles estão desnudos à palavra".


O figurino é assinado por Villela, em parceria com Maria do Carmo Soares. "É impossível um diretor de teatro ter um senso da totalidade da obra e não conhecer a pele do personagem", justifica Villela.


Antes mesmo de as roupas estarem prontas, Villela adiantou aos atores como seria o figurino, o que os auxiliou no processo de composição do personagem.


Estilo


Caracterizando-se como um diretor barroco, Villela é daqueles que economizam nos recursos cênicos a favor da valorização do texto e das metáforas. O roteiro de Dib Carneiro baseia-se na versão francesa da obra de Camus e busca torná-lo erudito e não tão coloquial como já aconteceu em outras versões de Calígula.


"Existe uma economia consciente e objetiva de elementos que o Gabriel propôs para a peça. É um espetáculo feito para o ator e para a palavra", acredita Thiago Lacerda.


Niilismo


Calígula é a terceira peça de uma trilogia niilista (escola que nega a ordem social estabelecida e conceitos tradicionais) dirigidas por Villela que teve início com Esperando Godot, original de Samuel Beckett (1906-1989), e Leonce e Lena, de Karl Georg Büncher (1813-1837).


Em agosto de 2008, todos os atores se reuniram no sítio do diretor, em Carmo do Rio Claro (MG). Foi lá que receberam o texto da peça e iniciaram pesquisas para a composição dos personagens. Também assistiram à série Roma, que, segundo os atores, serviu como um bom exercício dramatúrgico e fonte de referências. Somente no final de setembro é que os ensaios se iniciaram.


* Calígula vai reestrear em junho e viajará pelo país até dezembro deste ano.


Adaptado do original publicado no jornal A Tribuna em 27 de novembro de 2008.