sexta-feira, 30 de abril de 2010

Gentileza - Uma voz pela solidariedade

Cinquenta e seis murais pintados em pilastras de concreto do Viaduto do Caju, no Rio de Janeiro, trazem a mensagem de alguém que foi mal-interpretado por muitos na época em que peregrinava pelas ruas com seu estandarte, mas que hoje é visto como profeta: José Datrino, o Gentileza. Em uma extensão de 1,5 quilômetro, seus escritos formam um grande livro urbano, com sequência lógica. A confecção começou nos anos 80 e terminou no início da década seguinte.

É esse personagem carioca que Glória Perez homenageou na novela Caminho das Índias, na qual José Datrino é interpretado por Paulo José. Aliás, a autora aproveitou os escritos deixados pelo profeta para compor o texto da trama.

Com o mote "gentileza gera gentileza", o profeta, mesmo após sua morte, em 1996, mostra ao mundo que suas mensagens são atuais. Mais do que nunca, as relações humanas precisam ser mais fraternas.

"Gentileza era um sábio, tinha uma percepção da realidade diferente da nossa. E era um místico também. Todos os profetas não foram reconhecidos emsua época", afirma Leonardo Guelman, professor do Departamento de Arte da Universidade Federal Fluminense, coordenador do projeto Rio com Gentileza e autor dos livros Univvverrsso Gentileza (Editora Mundo das Ideias) e Brasil Tempo de Gentileza (Editora Eduff).


IDENTIFICAÇÃO
Paulo José não poderia estar mais feliz ao interpretar Gentileza. "Gravei na rua, na Cinelândia, na Rodoviária, enfim, no Centro do Rio. As pessoas aplaudiam porque o personagem despertava muita simpatia", afirma.

Para compor o personagem, Paulo José leu textos e obras a respeito de Gentileza, além dos próprios escritos de Datrino. Aliás, os relê sempre. "Ele gostava de repetir vogais e consoantes, e isso o tornava engraçado. Ele dizia que amorrr (com três erres) era o amor universal e vvvida (com três vês) uma existência superior e não a comum", conta o ator.

"Parecia um louco, mas na verdade era revoltado contra o egoísmo. Dizia coisas contundentes em relação ao capital, ao qual chamava de capeta", finaliza Paulo José.

MANIFESTAÇÕES CULTURAIS
Sobre Caminho das Índias, Guelman afirma que ficou feliz ao saber que o ator Paulo José havia sido escalado para dar vida ao Gentileza. "Devemos entender o Gentileza além do maluco beleza. A novela difundiu a sua mensagem para outros lugares do País". No Rio, está na moda vestir a camiseta com a frase Gentileza Gera Gentileza.

No disco Memórias, Crônicas e Declarações de Amor (2000), Marisa Monte gravou a música Gentileza, desua autoria, que homenageia o profeta. O livro de Guelman, Univvverrsso Gentileza, já foi adaptado para o teatro, com direção de Júnior Perim e Vinícius Daumas, e o roteiro de Gambo Júnior. Além disso, Dado Amaral e Vinícius Reis dirigiram o curta Gentileza, em 1994.

Biografia

José Datrino nasceu em Cafelândia (SP) em 11 de abril de 1917, e até os 20 anos trabalhou como lavrador. Desde os 12 anos, achava que teria família, filhos e bens, mas em 1937, foi para São Paulo e durante quatro anos não deu notícias. Depois, migrou para o Rio de Janeiro, casou-se e teve cinco filhos. Estabeleceu-se com uma transportadora, mas a partir de uma revelação, após a queima de um grande circo em Niterói, assumiu uma nova identidade: Jozze Agradecido, ou Gentileza. Foi internado em clínicas psiquiátricas, e nesses locais fazia a sua pregação. Nos anos 60, apresentava-se como representante de Deus, anunciando um novo tempo, e aos poucos tornou-se figura popular. Nunca aceitou dinheiro, mesmo assim rodou por todo o País e ficou ainda mais conhecido. Nos anos 70, percorreu vários jornais para levar a sua palavra. Nos anos 80 e 90, pintou os painéis que o consagraram. Faleceu em 29 de maio de 1996, aos 79 anos.

FONTE: BRASIL TEMPO DE GENTILEZA, DE LEONARDO GUELMAN


* Adaptado do original publicado no jornal A Tribuna em 14 de abril de 2009.

2 comentários:

  1. Bonitinha, acabo de descobrir que você tem um blog. Parabéns. Gosto da filosofia do Gentileza. Marisa Monte tem uma música que fala dele. Bjs

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  2. Eu tenho o livro "Brasil: Tempo de Gentileza". Não conseguia achar de jeito nenhum, então um amigo do Rio "gentilmente" me deu de presente! Sempre gostei do ofício dos profetas contemporâneos, que primeiramente são tidos como loucos, mas depois são reconhecidos como sábios.
    A obra de restauração do Livro Urbano e o tombamento do mesmo como Patrimônio Cultural foi um grande acerto do governo do Rio.
    O que a princípio poderia ser um "semi-analfabetismo" acabou virando estilo artístico, chama a atenção de quem passa. As pessoas comentam das letras repetidas etc, mas estão lendo a mensagem. Eu creio que foi um talento genuinamente inspirado por Deus.
    Mandou muito bem novamente Patrícia!

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